Espiar o livro alheio é indiscreto, mas irresistível!
Diana L. Corso
Sou
capaz de ridículos estratagemas para descobrir qual é o livro que alguém
esteja lendo em um local público. A capa contém a chave desse mistério,
desvela a alma do leitor, é o acesso para um acervo potencialmente
partilhável. Quem lê um livro que conhecemos deixa de ser um
desconhecido. Porém, essa curiosidade abusada é uma imperdoável
profanação da intimidade. Eu devia, como psicanalista, suportar
estoicamente a introspecção do próximo. Só me revelariam seus
pensamentos quem quisesse.
A
leitura é uma intimidade portátil, podemos carregá-la na bolsa, no
bolso. É uma experiência onírica controlável, nesse sentido melhor do
que as fantasias rebeldes dos sonhos noturnos. Se empolgante, nos
possuirá, mas também podemos abandoná-lo para divagar, assim como
postergar o clímax. Não é por acaso que a leitura foi acusada de
substituta ou incentivadora do onanismo. Sim, trata-se de um prazer
solitário: o de embalar sonhos.

Meter-se no livro do outro é voyeurismo,
do tipo clássico. O mesmo que leva a criança a espiar seus pais, ou que
alimenta a pornografia. O prazer alheio observado ou imaginado, revela e
ensina, o voyeur
viaja na cena, imagina-se parte dela. De forma segura, já que o espião
se protege no anonimato. Olhando, aprendemos os caminhos que o desejo
almeja percorrer. Da mesma forma, descobrir a obra que alguém lê é
participar da sua cena imaginária, de suas fantasias, adivinhar seu
sonho acordado. Não passa de uma devassidão pueril, mas a moça tinha
razão de ficar furiosa: é uma desagradável invasão de privacidade.
Incontrolável, no meu caso.
(http://www.marioedianacorso.com/voyeur-de-leituras)